Pairando sobre a pequena cidade bávara de Hohenschwangau estão as torres de um dos castelos de “contos de fadas” mais famosos do mundo. Schloß Neuschwanstein foi a fantástica criação do rei Ludwig II - um monarca que sonhava em criar para si um palácio medieval ideal, aninhado nos Alpes. Embora projetado para representar um castelo românico do século XIII [1], Neuschwanstein foi um projeto do século XIX, construído com métodos industriais e com confortos e conveniências modernas. De fato, sem os avanços tecnológicos da época, Ludwig nunca poderia ter escapado de sua fantasia medieval. [2]
O sonho de Ludwig iniciou durante sua infância. O jovem príncipe passava seus verões no castelo próximo de Hohenschwangau, uma reconstrução feita por seu pai Maximilian II na década de 1830. Construído sobre as ruínas medievais descobertas por Maximilian durante uma viagem de caça, Hohenschwangau foi um dos primeiros castelos do renascimento romântico construídos no que eventualmente se tornaria a Alemanha; sua combinação de estilo gótico inglês com conveniências contemporâneas serviria de influência formativa para o próprio castelo de Ludwig, ao longo do mesmo vale. [3]
Ludwig também era apaixonado pela mitologia e o folclore, especialmente como retratados na ópera. Um ano após tomar o trono da Baviera em 1864, o rei convocou e tornou-se patrono do compositor Richard Wagner. Sob o reinado de Ludwig, a música floresceu na capital da Baviera, Munique. [4] À medida que o novo rei enfrentava críticas e oposições crescentes na cidade, ele começou a retirar-se da cidade para as montanhas (para Hohenschwangau) e às lendas ilustradas tão vividamente pelas óperas de Wagner. Ali, nas fantasias do passado, Ludwig podia escapar dos confrontos de seu presente. [5]
A "gota d'água" veio em 1866, quando uma derrota militar contra a Prússia levou a restrições dos poderes de Ludwig como rei. Não mais um governante soberano, Ludwig compensou construindo para si uma série de palácios nos quais, a partir de 1867, ele poderia ser um monarca autocrático. Como seu pai, ele escolheu o terreno de dois castelos em ruínas como base para seu palácio novo. Ao contrário de seu pai, no entanto, ele se dedicou a criar um castelo que se aproximasse mais do estilo de seus antepassados do que de Hohenschwangau. Inspirado por Wagner, Hohenschwangau e pelos castelos da Alemanha medieval, Ludwig contratou o pintor cênico Christian Jank e o arquiteto Eduard Riedel para começarem a construção do "Novo Hohenschwangau" - que acabaria por ser conhecido como Neuschwanstein. [6]
Embora Riedel inicialmente planejasse construir Neuschwanstein das ruínas no local, logo ficou claro que a visão de Ludwig exigiria demolições para abrir caminho para uma escala maior. O cume alpino provou ser um local de construção incrivelmente desafiador. Uma estrada teve que ser construída para ascender os 200 metros até o cume da montanha, que teve que ser achatado laboriosamente em dois platôs adjacentes, a fim de servir como fundações seguras para o castelo. A construção subsequente fez uso de uma das primeiras gruas a vapor da Alemanha, que se tornou um anacronismo altamente visível ao lado do castelo medieval construído. As técnicas industriais continuariam a servir aos arquitetos e construtores durante a obra; a inovação era a única maneira de acompanhar os impacientes prazos de Ludwig. [7]
Neuschwanstein, como imaginado por Ludwig e ilustrado por Jank, era um castelo gótico idealizado. A visita de Ludwig a uma reconstrução contemporânea do Palácio de Wartburg, no entanto, fez o conceito mudar para um castelo românico maior com múltiplas estruturas levando a um edifício residencial real de cinco pavimentos. [8] Quando as primeiras pedras de fundação foram colocadas em setembro de 1869, Ludwig esperava estar vivendo em seu castelo dentro de três anos. Quatro anos antes ele havia se mudado para a Casa de Guarda, que era, nesse ponto, o único espaço pronto para a habitação. [9] Os palácios foram finalizados sete anos depois, em 1880; e Ludwig finalmente se mudou para seus apartamentos pretendidos em 1884. [10]
Uma vez que a casa de guarda e os palácios foram "coroados", o trabalho pôde prosseguir nas estruturas acessórias e no pródigo interior do próprio palácio. O complexo, tal como foi concebido, apresentava os seguintes elementos espaciais: a Casa de Guarda, dois pátios, o palácio, uma torre com uma capela ornamentada, uma Casa dos Cavaleiros, uma Casa das Senhoras e uma torre quadrada. A estrutura deveria ser composta principalmente de tijolos, assentados sobre uma base de concreto e revestidos de calcário. [11] A torre seria finalizada após a morte do rei em 1886, e mesmo assim apenas em uma forma simplificada; a torre de 90 metros de altura, que abrigaria uma capela gótica na sua base para formar o coração do castelo, nunca foi construída. [12]
Embora grande parte do interior dos palácios nunca tenha sido terminada, os poucos cômodos que foram completados evidenciam uma imagem vívida do último sonho de Ludwig para Neuschwanstein. Os apartamentos do rei no terceiro andar apresentam um dormitório gótico ornamentado, uma gruta artificial inspirada por uma ópera wagneriana e um jardim de inverno cuja vista panorâmica dos Alpes que cercam o castelo são proporcionadas pelas maiores janelas feitas até então, com três metros de altura. [13]
Estas janelas, que teriam sido impossíveis durante o período medieval, não eram as únicas características contemporâneas dos palácios: todo o edifício era equipado com aquecimento central e água corrente, inclusive com o lavatório do rei tendo um mecanismo de descarga automática. Um sistema elétrico de sino permitia que Ludwig convocasse os servos do outro lado do castelo, enquanto um par de elevadores permitia que ele o alcançasse seus aposentos sem subir nenhuma escada. Talvez o anacronismo mais flagrante, no entanto, fosse o par de telefones instalados no terceiro e quarto pavimentos. [14]
Enquanto as tecnologias industriais eram empregadas principalmente para facilitar a construção ou como concessões ao conforto humano, havia um caso em que isso era necessário à própria estrutura do castelo. Subindo do terceiro para o quarto andar, a sala do trono bizantino, revestida em ouro, estaria a principal vitrine do "poder divino" de Ludwig como Rei da Baviera. Todos os detalhes, desde a profusão de mosaicos cristãos até o candelabro em forma de coroa, pretendiam proclamar seu papel de intermediário entre o céu e a Terra. [15]
Embora não seja imediatamente aparente do espaço, a sala do trono é, na realidade, apoiada por uma estrutura metálica. As vigas formam uma grade estrutural superior, apoiando o teto e a abside arqueada acima do trono, e até mesmo o próprio trono repousando sobre suportes de ferro. [16] É quase poético que o trono - o elemento que mais representaria diretamente a realeza medieval idealizada de Ludwig - teria sido secretamente apoiado por características de um período em que ele desprezara: o seu próprio. A sala do trono possui um simbolismo adicional, no entanto, uma vez que nunca foi equipado com o item que lhe teria dado o propósito: o próprio trono. [17]
O estado financeiro e mental cada vez mais delicado de Ludwig levou seu governo a depô-lo por motivos de insanidade em 10 de junho de 1886. Ele foi removido de sua casa em Neuschwanstein dois dias depois para um hospital mental no castelo de Berg. Na noite seguinte, ele e seu psiquiatra foram encontrados mortos na margem do Lago Starnberg. [18]
Sete semanas depois, o governo bávaro abriu Neuschwanstein ao público, transformando o espaço recluso privado do rei em um destino turístico que hoje é visitado por 1,4 milhão de pessoas por ano. [19] Neuschwanstein tornou-se mundialmente conhecido como um ícone do castelo romântico ideal, tanto em si mesmo, como a principal inspiração para o Castelo da Bela Adormecida da Disney. [20] Enquanto Ludwig II não conseguiu escapar de seus problemas, sua maior fantasia - seu amado Neuschwanstein - perdura.
Referências
[1] "Neuschwanstein Castle." Bavarian Palace Department. Acesso em 26 de Março de 2016. http://www.schloesser.bayern.de/englisch/palace/objects/neuschw.htm
[2] "Interior and modern technology." Bavarian Palace Department. Accessed March 26, 2016. http://www.neuschwanstein.de/englisch/palace/interior.htm
[3] Knapp, Gottfried. Neuschwanstein. London: Edition Axel Menges, 1999. p7.
[4] "King Ludwig II of Bavaria." Bavarian Palace Department. Acesso em 26 de Março de 2016. http://www.neuschwanstein.de/englisch/ludwig/biography.htm
[5] Gottfried, p9.
[6] "Idea and History." Bavarian Palace Department. Acesso em 26 de Março de 2016. http://www.neuschwanstein.de/englisch/idea/index.htm
[7] Gottfried, p11.
[8] "Neuschwanstein Castle - an example of Historicism." Bavarian Palace Department. Acesso em 26 de Março de 2016. http://www.neuschwanstein.de/englisch/idea/histor.htm
[9] Encyclopædia Britannica Online, s. v. "Neuschwanstein Castle", accessed March 29, 2016, http://www.britannica.com/topic/Neuschwanstein-Castle.
[10] “Idea and History.”
[11] "Building History." Bavarian Palace Department. Acesso em 26 de Março de 2016. http://www.neuschwanstein.de/englisch/palace/history.htm
[12] Desing, Julius. The Royal Castle of Neuschwanstein. Lechbruck: Kienberged GmbH, 1998. p9.
[13] Gottfried, p15-17.
[14] “Interior and modern technology.”
[15] Desing, p16-21.
[16] Gottfried, p15.
[17] Desing, p16.
[18] Cowan, Henry J., and Trevor Howells. A Guide to the World's Greatest Buildings: Masterpieces of Architecture & Engineering. San Francisco: Fog City Press, 2000. p79.
[19] "Neuschwanstein Today." Bavarian Palace Department. Acesso em 26 de Março de 2016. http://www.neuschwanstein.de/englisch/palace/index.htm
[20] Cowan and Howells, p79.
- Ano: 1886